RECORTES DA NOSSA HISTÓRIA: OS MASSACRES DE CUNHAÚ E URUAÇÚ/RN

Durante a presença holandesa no território que hoje é o Rio Grande do Norte, os batavos tiveram como aliados os índios Tapúias, Potiguares e Janduís inimigos tradicionais dos Tupis. Natal durante o domínio holandês recebeu o nome de Nova Amsterdã.

Jacob Rabbi, judeu, alemão, natural do condado de Waldeck, emigrou para a Holanda onde foi contratado pela Companhia das Índias Ocidentais Holandesas e posteriormente veio para o Brasil com Mauricio de Nassau em janeiro de 1637.

Rabbi deixou um importante relato de sua viagem contendo informações sobre a geografia da capitania e descrições sobre os Janduís, chegando a casar-se com uma índia, chamada Domingas. Rabbi teria sido um dos poucos da Companhia das Índias que teria percorrido os sertões da capitania do Rio Grande e das capitanias vizinhas, participando da vida nômade dos inidios. Escrito em latim, tem o título De Tapuiyorum moribus et consuetudinibus ex relatione Jacobi Rabbi, qui per aliquot annos inter illos vixerat (“A moral e os costumes dos Tapuias com Jacob Rabbi, que viveu vários anos entre eles”)

Cabe destacar que os massacres de Cunhaú e Uruaçu são fatos contemporâneos de um momento histórico bastante conturbado da União das Coroas Ibéricas, ocorrida entre 1580 e 1640, conhecido período em que os reinos de Portugal e Espanha passaram a ser governados por um único soberano da coroa espanhola, tendo em seguida havido a restauração da coroa portuguesa e a expulsão dos holandeses do Brasil.

A Companhia das índias Ocidentais havia concedido créditos aos senhores de engenhos para aumentarem sua produção, contudo os colonos portugueses que haviam adquirido os créditos alegavam dificuldades para cumprir os pagamentos devidos. Após a saída do conde de Nassau, a administração holandesa tornou-se piais severa, passando a cobrar altos impostos e a pressionar de forma impetuosa o pagamento das dívidas. Os proprietários de terras que estavam endividados com os holandeses, sobretudo os senhores de engenho de Pernambuco, decidiram tomar a iniciativa da luta. Prepararam, à surdina, a chamada Insurreição Pernambucana, incentivando a população em geral a participar do movimento, argumentando que assim se livrariam das dívidas cora os holandeses. Em 1645, ocorreu o primeiro embate, próximo a Recife, iniciando uma luta que se estenderia durante anos, espalhando-se por todo o domínio holandês.

Os referidos massacres ocorreram em 1645 e geralmente não são apontados como atrelados a todo este contexto acima, sendo descrito pela historiografia oficial, principalmente por Câmara Cascudo, como um martírio de fé católica: Cunhaú em 16 de julho e Uruaçu em 03 de outubro, em oposição aos calvinistas holandeses. Cascudo baseou suas conclusões basicamente na obra de Frei Manuel Calado: "O Valeroso Lucideno e Triunfo da Liberdade", que vangloria os portugueses, destacando os valores católicos. Sabe-se que durante o domínio holandês em Recife e partes do Nordeste foi um dos poucos períodos da colônia em que reinou certa tolerância religiosa, tendo inclusive muitos dos judeus do Recife com a expulsão dos holandeses se dirigido para a Nova Amsterdã, hoje Nova Iorque. Recomenda-se sobre o tema a leitura do excelente Arrancados da Terra de Lira Neto.

Os mortos de Cunhaú e Uruaçú são tidos como mártires pela igreja católica e foram canonizados recentemente pelo Papa Francisco. Fossemos canonizar os diversos massacres ocorridos no Brasil Colônia teríamos uma dezena de autóctones e originários da terra como mártires e santos. No Rio Grande do Norte em 3 de outubro é feriado estadual para homenagear os mártires de Cunhaú e Uruaçu.

Imagem: Mapa de Natal produzido pelos holandeses (1633).



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