RECORTES DA NOSSA HISTÓRIA: OS TUMBEIROS

Os navios negreiros que faziam a travessia do atlântico trazendo a força a gente africana para as Américas eram chamados de tumbeiros, ou seja, tumbas flutuantes. Estima-se que em 350 anos de tráfico negreiro cerca de 1,8 milhões de cadáveres foram jogados ao mar, pois dos 12,5 milhões despachados da África somente 10,7 chegaram aos portos do continente americano. Em seu Volume I de Escravidão, Laurentino Gomes descreve que tubarões seguiam as rotas dos navios negreiros para se alimentar dos mortos durante a travessia. (ver banco de dados < https://www.slavevoyages.org/ > The Transatlantic Slave Trade Database)

Segue a seguinte transcrição referido livro:
“Os tubarões começavam a seguir os navios negreiros assim que as embarcações alcançavam a costa da Guiné”, escreveu o historiador Markus Rediker. Eram observados pelos marinheiros da Senegâmbia ao Congo e Angola, passando pela Costa do Ouro e dos Escravos (atuais Gana, Togo, Republica do Benim e Nigéria), sempre que os navios estavam ancorados ou se moviam lentamente.” Um corpo ou um homem vivo que caísse nas águas seria imediatamente destroçado. Alexander Falconbridge, médico britânico que participou de quatro viagens negreiras entre 1780 e 1787, testemunhou diversas cenas como essa enquanto observava o embarque de cativos na costa de Bonny (atual Nigéria). Segundo ele, os tubarões cercavam os navios, “em número inacreditável, devorando rapidamente os negros que eram arremessados da amurada”. Relato semelhante é o de John Atkins, também médico da Marinha Britânica na primeira metade do século XVIII: “ Diversas vezes eu vi os tubarões se apoderarem de um cadáver , assim que era jogado ao mar, despedaçando-o e devorando-o com tal voracidade que não dava tempo sequer para que começasse a afundar nas águas. – páginas 49/50 do Volume I – Escravidão – Laurentino Gomes.
Nesse comércio de escravos de proporções jamais antes vistas se envolveram além de portugueses, holandeses, ingleses, franceses e espanhóis; os suecos, suíços, poloneses, lituanos, russos, alemães e até dinamarqueses, ajudando a criar na África uma elite de reinos com apoio europeu e voltados praticamente para esse tipo de comércio tais como: Reinos Axante e Fanti, em Gana; Aladá, no Benim; Oió, na Nigéria; Daomé entre o Benim e a Nigeria; Cassanje e Matamba, em Angola. Como dizia o padre Fernando Oliveira em 1555: “sem compradores não haveria vendedores de cativos na África” (A. C. De C. M. Saunders, A Social History of Black Slaves nd Freedmen in Portugal, 1441-1555)
Os dinamarqueses ergueram em Acra, atual Gana, o Christiansborg Castle, replica menor de um castelo de mesmo nome localizado em Copenhagen, hoje atração turística da cidade de Acra. Em Elmina, outro porto de Gana, ficava o Cape Coast Castle erguido pelos suecos em 1655 e capturado pelos ingleses em 1664. Hoje restaurado o Cape Coast Castle é alvo de peregrinação de turistas americanos.
Os banqueiros suíços ajudaram a financiar mais de 100 expedições escravistas, segundo Laurentino Gomes:
“Um deles, Christophe Bopurcard, patrocinou sozinho mais de vinte viagens, nas quais foram transportados 7 mil africanos escravizados para a América. No dia 14 de abril de 1719, a Republica de Berna comprou 150 mil libras em ações da South Sea Company, de Londres, uma das maiores empresas do comércio de escravos. Os navios negreiros bancados pelos suíços em geral partiam do porto de Nantes, na França, e ostentavam nomes como La Vie de Bâle (A cidade da Basileia), Ville de Lausane e Helvética.” - página 190, Volume II – Escravidão – Laurentino Gomes.
O Brasil foi o maior país escravista das Américas tendo recebido quase 5 milhões de africanos (40% do total) nessas tumbas flutuantes que cruzaram o Atlântico e que eram famosas pelo mau cheiro:
“Aquele barco(...), pelo intolerável fedor, pela escassez de espaço, pelos gritos contínuos e pelas infinitas misérias de tantos infelizes, parecia um inferno”, relatou Frei Sorrento, capuchinho italiano e testemunha do embarque de novecentos escravos de Luanda para a Bahia, em 1649. “Esta é a navegação mais dolorosa que existe em todo o mundo”, confirmou um de seus colegas, Dinigi Carli, também conhecido como frei Piacenza, que em 1669 viajou a bordo de um navio negreiro carregado com 690 escravos entre Angola e Salvador, na Bahia.” página 287/288, Volume I – Escravidão – Laurentino Gomes.
Imagem: navio negreiro de Robert Riggs.


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